Na Estação Ecológica do Barreiro Rico, em Anhembi, abordagens distintas são compartilhadas entre pesquisadores a fim de compreender a relação da floresta com o muriqui-do-sul e conectar populações por meio de corredores ecológicos. Prevenção dos incêndios na área fez com que grupo voltasse a prosperar após quase desaparecer.
Cercada de pastagens, plantações de cana-de-açúcar, eucalipto e laranja, uma área de 292 hectares no interior de São Paulo abriga cinco dos cerca de 1.300 indivíduos remanescentes na natureza de muriqui-do-sul, ou mono-carvoeiro (Brachyteles arachnoides). Junto com o muriqui-do-norte (B. hypoxanthus), os mono-carvoeiros representam os maiores primatas das Américas, endêmicos da Mata Atlântica e exclusivos do território brasileiro.
Observar do chão a família residente na Estação Ecológica do Barreiro Rico, uma unidade de conservação integral estadual criada em 2006, não é fácil para os humanos, primatas que há muito perderam a habilidade de escalar árvores com destreza.
Por isso, numa manhã de agosto, a doutoranda Beatriz Robbi, do Laboratório de Manejo e Conservação de Fauna, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), sobrevoa a copa das árvores com um drone. O pequeno veículo aéreo guiado por controle remoto é dotado de um sensor termal e de uma câmera. No começo da manhã e no fim da tarde, quando as temperaturas são mais amenas e os galhos e folhas estão mais frios, é mais provável detectar os muriquis pelo calor emanado de seus corpos, de braços alongados e barriga protuberante.
“No total, são 12 indivíduos conhecidos na chamada Área de Proteção Ambiental do Barreiro Rico, que junto com a Estação Ecológica compõe um mosaico de cerca de 30 mil hectares, com fazendas, empresas e fragmentos de Mata Atlântica. No caminho entre essas porções de floresta, porém, existem estradas, fios de alta tensão, plantações, pastagens e construções, o que atrapalha, quando não impossibilita, os grupos de se encontrarem e se reproduzirem entre si”, explica Robbi.
A principal forma de fazer a ligação da área com outros remanescentes são os chamados corredores ecológicos, florestas que conectem os fragmentos de Mata Atlântica então isolados. Esse é o objetivo de um grupo de pesquisadores, ONGs e da Fundação Florestal, órgão que administra as unidades de conservação do Estado de São Paulo.
Segundo Luana Carvalho, mestranda no Laboratório de Silvicultura Tropical (Lastrop) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), que também desenvolve pesquisa no local, por meio do estudo da ecologia da paisagem e de sensoriamento remoto será possível identificar os fragmentos florestais de maior valor ecológico para o muriqui, ou seja, aqueles que ainda possuem qualidade para sua reprodução, alimentação e abrigo.
“A partir disso, poderemos determinar onde e como conectar esses fragmentos. Estamos priorizando espécies arbóreas importantes para a alimentação e uso pelo muriqui, o que nos permitirá orientar uma restauração florestal focada nessa espécie. Assim, poderemos criar corredores ecológicos que, além de expandir a cobertura florestal, oferecerão os recursos alimentares necessários, respeitando as exigências de cada espécie arbórea”, afirma.
Seu projeto, orientado por Edson Vidal, um dos coordenadores do Lastrop e professor na Esalq-USP, busca entender a estrutura da floresta e como ela sustenta as espécies. A área estudada é parte dos 4% remanescentes de floresta estacional semidecidual que restam na Mata Atlântica. Mais seca do que a floresta ombrófila, fitofisionomia mais conhecida por áreas como a Serra do Mar, por exemplo, a estacional semidecidual perde parte das folhas durante os meses de seca como forma de conservar água nas plantas.
A restauração planejada na região faz parte do projeto Corredor Caipira, iniciativa financiada pela Petrobras que visa estabelecer corredores ecológicos para conectar o território.
“O projeto busca justamente reconectar os fragmentos florestais para que a biodiversidade não fique isolada, o que aumentaria em muito os riscos de extinção de espécies em declínio populacional. Os animais precisam de conexão para se reproduzir, para procurar alimento e mesmo aumentar as chances de não desaparecerem por conta de algum evento não controlado, como um incêndio que destrua uma área como essa, por exemplo”, afirma Pedro Brancalion, professor da Esalq-USP e outro coordenador do Lastrop.
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